Qual o cenário da fome no Estado de Sergipe?
Sergipe tem o 4º pior índice nacional de população faminta! Para abordar o tema com a profundidade que ele merece, a CUT Sergipe entrevistou a economista do DIEESE Flávia Santana
Escrito por: Iracema Corso
Segundo dados divulgados pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Pessan), coletados entre novembro/2011 até abril/2021, Sergipe e Pará são os dois estados brasileiros em que 30% de sua população está passando fome e ambos ocupam a 4ª posição nacional no ranking de maior percentual da população com fome.
Nesta ENTREVISTA com Flávia Santana, vamos discutir o resultado da pesquisa recente e os fatores que levaram o estado sergipano a esta situação.
1. Quais os 5 estados brasileiros com maior percentual da população passando fome?
O relatório, lançado pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan) em 14/09/2022, traz os resultados do II Inquérito Nacional da Insegurança Alimentar no Brasil no Contexto da Covid-19 (II VIGISAN). Nele, consta que, no período de novembro de 2021 a abril de 2022, na comparação com os 26 estados brasileiros e Distrito Federal, seis destacam-se com as cinco maiores distribuições percentuais de sua população passando fome: Alagoas (36,7%), Piauí (34,3%), Amapá (32,0%), Sergipe e Pará ocupam a quarta posição, ambos com 30,0%, e Maranhão (29,9%).
2. Qual o cenário da fome em Sergipe?
Nota-se que quando a pessoa de referência no domicílio era trabalhador/a informal ou desempregado/a, 72,2% dos domicílios possuíam insegurança alimentar moderada e grave. Quando era trabalhador/a formal, a maioria dos domicílios (75,3%) tinha segurança alimentar e insegurança alimentar leve. Já quando a pessoa de referência era trabalhador/a autônomo/a, 86,4% dos domicílios tinham uma situação de segurança alimentar e insegurança alimentar leve. Deve-se ressaltar que em Sergipe, 71,1% dos domicílios avaliados tinham alguma situação de insegurança alimentar, atingindo um contingente de 1,663 milhão de moradores. Em 30,0% dos domicílios sergipanos havia fome, correspondendo a 702 mil moradores. A fome prevalecia em 76,5% dos domicílios em cujo rendimento domiciliar per capita era de até ½ salário mínimo e em 35,3% daqueles com rendimento domiciliar per capita de mais de 1/2 a 1 salário mínimo.
3. De que forma o aumento do desemprego em Sergipe contribui pra este cenário?
O desemprego é outro determinante central da condição de vulnerabilidade social e da insegurança alimentar das famílias. Sergipe vem sobressaindo-se no cenário nacional, com uma das mais elevadas taxas de desocupação do país. Segundo o resultado do 2º trimestre de 2022 da Pnad contínua trimestral, do IBGE, Sergipe teve uma taxa de desocupação de 12,7%, ocupando a terceira maior taxa, atrás apenas da Bahia e Pernambuco. No diagnóstico da Rede Penssan, no total dos 450 domicílios sergipanos que compuseram a amostra da pesquisa, verificou-se que em 23,3% deles havia ao menos um morador desempregado. Investigando o efeito da pandemia nas condições financeiras, verificou-se que em 54,0% dos domicílios da pesquisa havia moradores endividados. Além disso, em 27,1% dos domicílios sergipanos da pesquisa, os moradores recebiam entre Mais de 1/4 até 1/2 Salário Mínimo per Capita (SMPC).
4. Quais medidas de longo prazo precisarão ser tomadas pelo próximo governador ou governadora eleita?
É preciso adotar um programa de desenvolvimento nacional para o país, que esteja assentado na defesa e retomada de sua soberania e restabelecimento do pleno funcionamento democrático, com os Poderes exercendo os seus papéis constitucionais. Adicionalmente, é necessário revogar a Emenda Constitucional nº 95 e rever as reformas trabalhista e previdenciária, além de suprimir a Política de Paridade de Preços de Importação (PPI) da Petrobras e rever as privatizações dos seus ativos já ocorridos, assim como também rever a venda da Eletrobrás. Concordando com a afirmação da Rede Penssan: “É necessário fazer uma revisão das políticas públicas existentes, as quais, mesmo mantendo a universalidade, devem ser sensíveis às necessidades e particularidades locais”.
Por fim, é preciso reverter a extinção de todas as políticas que davam sustentação às famílias, no combate à fome e a insegurança alimentar e nutricional. Algumas delas são: a política de estoque regulador de alimentos, a criação de crédito e incentivos fiscais para a agricultura familiar, a retomada do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae).
5. Qual a responsabilidade do governo Federal?
O Governo Federal é o principal responsável pela crise socioeconômica e política que o Brasil está passando, por meio da adoção de inúmeras medidas desestruturantes, dentre as quais se destacam a Emenda Constitucional nº 95 (conhecida como Teto dos Gastos), as reformas trabalhista e previdenciária, a autonomia do Banco Central, a extinção da política de valorização do salário mínimo e o fim de programas importantes como o de aquisição de alimentos. Assim, as condições de vida, de trabalho e acesso aos alimentos da maioria das famílias brasileiras vêm se degradando e pioraram muito com a pandemia da COVID 19, a partir de março de 2020, mas não surgiram nesse período mais recente.
Na verdade, a pandemia agravou um quadro de crescimento de brasileiros vivendo com insegurança alimentar e fome ao se sobrepor às crises política, econômica e social, que já existiam no país e vem se acelerando desde o ano de 2015. Conforme assinala a Rede Penssan: “nesse contexto trágico, as desigualdades se aprofundaram e a fome volta ao cenário nacional como um problema social de dimensões nacionais e não mais restrito a grupos historicamente vulneráveis, em regiões específicas”.
6. Qual a responsabilidade do governo de Sergipe diante deste cenário?
O governo do estado tem responsabilidade compartilhada com o ente Federal, tanto na piora das condições de vida de sua população, quanto na adoção de medidas que busquem sanar ou reduzir o problema. Isso ocorre, quando o ente estadual adota as mesmas medidas político-administrativas e econômicas do Governo central para a sua região. Entretanto, mesmo quando difere o seu planejamento econômico e político administrativo, ainda assim depende de transferências e repasses de recursos do plano nacional, sofrendo com a ausência de políticas públicas, sobretudo, na área social, que vem sendo extintas ou inviabilizadas por um corte muito significativo de financiamento.
Fotos: 1- Reprodução, 2- CUT Brasil
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